2.04.18
STF, Lula e a grandeza de um Tribunal
“Não é compatível com o inc. LVII do art. 5º da Constituição a tese firmada pelo Supremo Tribunal Federal no HC 126.292”, escreve o professor José Afonso da Silva no parecer pro bono oferecido no Habeas Corpus 152.752, impetrado em favor do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, cujo julgamento será retomado nesta quarta-feira, dia 4 de abril. Confira a íntegra do parecer (clique aqui), com destaque para o capítulo ‘A grandeza de um tribunal’:
7. A grandeza de um Tribunal
58. A grandeza de um tribunal não se perde quando, no cumprimento de sua missão constitucional, presta a sua jurisdição sem temor e sem concessão e não se sente apequenado pelo fato de rever sua posição em favor dos direitos fundamentais, a favor de quem quer que seja que lhe bata às portas. Um Tribunal só se diminui e perde credibilidade quando decide contra ela, qualquer que seja a sua motivação.
59. Decisões dos tribunais colegiados, no geral, se compõem por maioria de votos de seus componentes. Esse método contribui para a obtenção de julgados consistentes com a ordem jurídicas. Mas isso, às vezes, não acontece, como no caso do HC 126.292.
60. De fato, nesse caso, como ficou demonstrado ao longo deste parecer, a maioria do STF constitui o julgado, com a devida vênia, com votos baseados em teses, fundamentos, conceitos, argumentos e fatores equivocados. Apesar disso, nunca apoiei e não concordo com a generalização da afirmativa de João Mangabeira, quando disse que o órgão que mais falhou na República no período que indicou (1892-1937), embora reconheça que, em algum grau, a observação [que] Oscar Vilhena Vieira faz do papel de guarda da Constituição pelo Supremo é procedente e este caso que estamos apreciando aqui o prova. Diz ele:
“O cumprimento da função de guarda da Constituição não tem sido realizado sem dificuldades e insucessos nesses mais de 100 anos.”
61. Não sufrago essa generalização, porque equívocos e erros são eventuais e circunstanciais em face de fatores do momento, enquanto os acertos são sempre perenes. Por isso, destaquei e destaco que essas arguições dizem respeito à postura do grande Tribunal diante de fatos e arbitrariedades políticas. Tecnicamente, o tribunal teve sempre muita grandeza. A esse propósito é que se deve ter em mente a opinião de Ruy Barbosa, que, sem se dirigir diretamente ao STF, reconheceu grandes triunfos na Justiça Brasileira: “Grandes triunfos, nesse quarto de século [Ruy morreu em 1923], registra a justiça brasileira. Os direitos supremos, algumas vezes imolados, acabam por vingar, em parte, na corrente dos arestos. Haja vista os grandes resultados, que, graças a ela, se apurara, sob o estado de sítio deste ano, quando, mercê das suas sentenças, alcançamos salvar, da liberdade de imprensa, uma parte considerável, e preservar os debates parlamentares das trevas, em que os queria envolver a a ditadura, com a cumplicidade submissa do próprio Congresso Nacional”.
62. Julgar contra a Constituição é um ônus que sempre há de pesar muito na consciência dos julgadores, mormente se forem integrantes de uma Corte constitucional, por isso mesmo são sempre propensos a corrigir rumos.
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José Afonso da Silva, advogado, é professor titular aposentado da Faculdade de Direito da USP. Parecer pro bono oferecido no HC 152.752/PR.
Foto: Dorivan Marinho/SCO/STF.
AQUI, MAIS UMA VEZ, O MESMO SENTIMENTO, O MESMO ANSEIO:
GOSTARIA DE, NO FUTURO, PODER REPETIR EM RELAÇÃO AOS MINISTROS DO STF, INDISTINTAMENTE, O QUE DISSE CHURCHILL SOBRE O PAPEL DOS PILOTOS DA RAF NA SEGUNDA GUERRA MUNDIAL: “NUNCA ANTES NO CAMPO DOS CONFLITOS HUMANOS, TANTOS DEVERAM TANTO A TÃO POUCOS”.