1.03.14
Anotações sobre o julgamento dos embargos infringentes
Algumas anotações sobre o julgamento dos embargos infringentes no processo do mensalão, ontem (26/2), no Supremo:
1. O presidente do STF, ministro Joaquim Barbosa, disse a certa altura algo como: “Temos a chance de fazer Justiça, de dar o exemplo”. Essa é apenas mais uma prova de que ele não vê a Ação Penal 470 como um processo, mas como uma causa política. E quando um juiz vê uma ação judicial como causa política as chances de que sejam cometidas injustiças crescem vertiginosamente. Processo penal não tem de servir “pra dar exemplo”. Foi “pra dar exemplo” que enforcaram, esquartejaram e penduraram pedaços do corpo de Tiradentes, entre outros vários, pelas ruas. Achei que havíamos evoluído um tantinho desde então.
2. Barbosa também atacou o ministro Luís Roberto Barroso de todas as formas possíveis. Chegou a dizer que ele parece ter chegado ao STF “com o voto pronto”. A acusação é muito grave e feita claramente para desestabilizar o julgamento e atingir a credibilidade de Barroso. Causar-lhe embaraços com a opinião pública. Quase de dedo em riste, Barbosa sentenciou: “Seu voto não é técnico”. Barroso não caiu na armadilha.
3. Os ministros queriam acabar ontem o julgamento dos infringentes. Barbosa não permitiu. Ele é o presidente e pode encerrar a sessão, o que fez. Barbosa sempre bradou que gostaria de “acabar logo com esse julgamento”. Ontem teve essa chance, e não o fez. Por quê? Para garantir a sequência do show hoje. Uma das justificativas dele era a ausência do ministro Gilmar Mendes na sessão. Sinal dos tempos. Eu já vi por diversas ocasiões o mesmo Barbosa pedir a continuidade de julgamentos e clamar a desimportância da presença de Gilmar Mendes no plenário. O que mudou?
4. O mais grave, contudo, foi Barbosa ter admitido que as penas fixadas pelo crime de formação de quadrilha foram elevadas com o objetivo, sim, de evitar a prescrição. Com o objetivo, sim, de fazer com que determinados réus tivessem de cumprir pena em regime inicial fechado. Isso é julgar o processo de acordo com a cara do réu, não de acordo com o crime que ele cometeu. Aí, meus caros, me perdoem, mas o presidente do STF admitir isso, e ficar por isso mesmo, é o início de uma derrocada do sistema judicial sem precedentes desde a redemocratização. E triste mesmo é que poucos estejam se dando conta disso.
Uma observação: se os réu fossem tucanos, democratas, o Jair Bolsonaro ou o general que escreveu que o Golpe de 64 foi uma “revolução democrática”, minhas críticas seriam as mesmas. O que está em jogo é um sistema de Justiça, mais do que um processo e alguns destinos.
Abaixo, dois trechos do voto do ministro Luís Roberto Barroso que dispensam comentários. Enjoy it!
“Fontes diversas divulgam o sentimento difuso de que qualquer agravamento das penas é bem-vindo e de que a imputação de quadrilha, em particular, teria caráter exemplar e simbólico. É compreensível a indignação contra a histórica impunidade das classes dirigentes no Brasil. Mas o discurso jurídico não se confunde com o discurso político. E o dia em que o fizer, perderá sua autonomia e autoridade. O STF é um espaço da razão pública, e não das paixões inflamadas. Antes de ser exemplar e simbólica, a Justiça precisa ser justa, sob pena de não poder ser nem um bom exemplo nem um bom símbolo”.
“Minha posição é de que o marco institucional representado pela Ação Penal 470 servirá melhor ao país se não se apegar a rótulos infamantes ou a exacerbações punitivas. Justiça serena, como deve ser, rigidamente baseada naquilo que a acusação foi capaz de demonstrar, sem margem de dúvida. A condenação maior que recairá sobre alguns dos réus não é prevista no Código Penal: a de não haverem sequer tentado mudar o modo como se faz política no Brasil. Por não terem procurado viver o que pregavam. Por haverem se transformado nas pessoas contra quem nos advertiam”.
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Rodrigo Haidar é jornalista especializado na cobertura da área jurídica.
Publicado originariamente no Facebook do autor, 27/2/2014.
Clique aqui para ler o voto do ministro Luís Roberto Barroso nos embargos infringentes da AP 470.
Fotos: SCO/STF.
Interessante, não vi nenhuma das críticas ao Ministro Joaquim Barbosa ter fundamento jurídico?! Mas vi, assisti e acompanhei o julgamento do início ao fim, vi o Min. Barbosa soltar críticas pq não havia fundamentos jurídicos para desqualificar o crime de formação de quadrilha… a verdade é que esse é sim um julgamento político, tanto é que estamos aqui comentando a falácia que se fez no STF, modificando toda uma jurisprudência sólida sobre o assunto para beneficiar toda uma classe política…. Parabéns site Constitucionalista… vcs perderam meu respeito
Só um minuto: o discurso de Barroso, aquele bem dèmodè com o qual iniciou sua peroração, não foi político? Se não foi político, foi o quê?
Pois é, Joaquim pra lá Joaquim pra cá,a mim o que importa é saber:houve ou não houve formação de quadrilha? o resto com todo o respeito são disputas de vaidades e também ingerências políticas no Tribunal.Ora, tá claro que o JB é uma figura arrogante pouco afeita ao contraditório, mas ele só tem um voto, e os outros que já tinham decidido pela condenação por quadrilha,como Pelusso e Ayres Brito teriam também interesse em aparecer na TV? O STF desfez uma sentença que já tinha sido prolatada.Quando vejo notícias sobre o mensalão,só se fala em Dirceu,Genoino,Delúbio , quando estão condenados mais de 20 réus,que cumprem pena sem essa barrulheira feita com os acima referidos,claro porque fazem parte
do PT.Com a decisão de ontem ninguém mais é quadrilheiro, nem o Valério.Benza Deus!
Artigo tendencioso…
Gostei muito dessa análise. Muito lúcida!
Concordo com a Yascara e com Marialba.
Artigo altamente tendencioso. Uma pena, eu tinha respeito pelo blog.