7.06.14
Controle concentrado: a quem interessa?
(…) há um severo descompasso entre a prática jurisdicional e a teoria de que a Constituição de 1988, ao ampliar os legitimados, teria construído um “sistema de defesa da Constituição tão completo e tão bem estruturado que, no particular, nada a fica a dever aos mais avançados ordenamentos jurídicos da atualidade”[1]. Fica evidenciada, nessa análise, que esse tão bem estruturado e tão completo sistema não tem efetivamente desenvolvido uma verdadeira defesa dos direitos e garantias fundamentais, tampouco a ampliação dos legitimados favoreceu esse movimento.
Ao contrário, a Constituição e os movimentos legais e jurisprudenciais posteriores favoreceram a construção de um processo gradual, mas efetivo, de retirada de outras vias, como o controle difuso e concreto, como instrumento para essa defesa de direitos e garantias fundamentais. A ampliação do controle concentrado, pouco cidadão e pouco efetivo na defesa de direitos e garantias fundamentais, vem sendo acompanhada da subtração da discursividade que acontece no sistema difuso. Em síntese, há um claro problema que agora começa a ser diagnosticado e que precisa de um forte debate cívico em torno do papel que devemos esperar de uma corte constitucional.
A questão a ser enfrentada é a dos processos de seletividade a partir dos quais são definidos os interesses que serão tutelados por meio do controle concentrado. Atualmente, há uma forte seletividade em termos de agentes legitimados (que fortalece o controle federativo e o corporativo), combinado com uma seletividade nas decisões judiciais (que privilegiam o controle formal e o material baseado em regras de estrutura administrativa, e não na eficácia dos direitos fundamentais). Assim, o problema fundamental não é de eficiência nem de celeridade, pois importa pouco saber quantos pedidos serão julgados e quando eles serão decididos, quando existe um comprometimento estrutural do sistema com redes de seletividade que contribuem para um esvaziamento das ADIs como forma de efetivação de direitos fundamentais e de garantia do interesse público. De pouco adianta concentrar os esforços legislativos, administrativos e jurisprudenciais na conquista de uma maior eficácia, quando o problema fundamental do sistema de controle concentrado está nas formas perversas de seletividade que ele engendra.
Trecho da pesquisa A Quem Interessa o Controle Concentrado de Constitucionalidade?: O Descompasso entre Teoria e Prática na Defesa dos Direitos Fundamentais, apresentada na última quarta-feira, 4 de junho, na Faculdade de Direito da UnB.
A pesquisa, financiada pelo CNPq e coordenada pelos professores Alexandre Araújo Costa (IPol-UnB) e Juliano Zaiden Benvindo (FD-UnB), contou com a participação de 13 pesquisadores que analisaram quase 4.900 Ações Diretas de Inconstitucionalidade (ADI) ajuizadas no Supremo Tribunal Federal (STF) entre os anos de 1998 a 2002.
Para saber mais, clique aqui para ler o relatório e aqui para ver os gráficos da pesquisa.
Fonte: Faculdade de Direito da UnB.
Foto: Carlos Humberto/SCO/STF.
Nota:
[1] COELHO, Inocêncio Mártires. “Experiência Constitucional Brasileira: da Carta Imperial de 1824 à Constituição Democrática de 1988”. In: MENDES, Gilmar Ferreira; COELHO, Inocêncio Mártires; BRANCO, Paulo Gustavo Gonet. Curso de Direito Constitucional. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 208.