24.08.13
O jornalista e a liberdade de informação
O Tribunal Europeu dos Direitos do Homem é uma jurisdição internacional com sede em Estrasburgo, e é composto por um número de juízes igual aos dos Estados Membros do Conselho da Europa que ratificaram a Convenção para a proteção dos Direitos do Homem e das Liberdades Fundamentais. Copiei e colei esta definição do próprio sítio original.
Referida Corte, mais conhecida na língua universal como European Court of Human Rights, julgou, em 28.06.11, o caso Pinto Coelho v. Portugal (Application n. 28439/08), do qual, por razões óbvias, lembrei-me na última segunda-feira, dia 19.08.13.
Vamos aos fatos. Sofia Pinto Coelho é uma jornalista nascida em Lisboa no ano de 1963. Em 1999, a profissional mostrou, em uma reportagem televisiva, cópia da acusação formalizada contra um ex-diretor da Polícia Judiciária portuguesa. Em outubro de 2006, a Corte de Oeiras a considerou culpada por haver divulgado tal informação, o que teria representado infração ao art. 88 do Código do Processo Penal. Foi, então, condenada a uma pena pecuniária de dez euros por dia pelo prazo de quarenta dias e mais despesas processuais. Seu recurso não foi conhecido pela Corte de Apelação de Lisboa, tampouco pela Corte Constitucional lusitana, pelo que a sentença tornou-se definitiva ao final de 2007. Invocando o art. 10 da Convenção Europeia dos Direitos Humanos, a jornalista recorreu à Corte Europeia, a qual concluiu, há pouco mais de dois anos, e em decisão ainda não definitiva, que a exibição em questão não somente representou uma afronta à liberdade de expressão, mas também que serviu, em termos concretos, a embasar com precisão e prova de autenticidade a matéria exibida na tevê. E mais: a Corte Europeia condenou o Estado português a indenizá-la com a soma de 4.040,32 euros pelos prejuízos ocasionados.
O sigilo existe por razões óbvias e o agente que divulga a informação secreta há, a princípio, de responder civil e criminalmente por seu ato. Esta é uma afirmação de caráter universal. Quanto aos jornalistas, porém, não existe tratamento uniforme. Cada Estado lida com a questão de acordo com os parâmetros nacionais ditados pela lei e pela jurisprudência.
Lei da Mordaça pode ser encontrada mundo afora. Não é privilégio de portugueses ou de americanos. Mesmo aqui, no Brasil, há quem defenda, com veemência e fundamento, que se o ato de revelar a informação sigilosa é de ser considerado criminoso, assim também o será o do jornalista que a divulga.
Esta questionável lógica ficou evidente quando o mundo tomou conhecimento de que o companheiro de Glenn Greenwald ficou retido por quase nove horas no aeroporto de Heathrow. O brasileiro nunca trabalhou para nenhuma agência de segurança e segue-se o fato de que sequer é jornalista. Aliás, analistas e comentaristas afirmaram, em uníssono e à exaustão, que a detenção foi puro ato de vingança e retaliação.
Não me atrevi a escrever este texto para julgar este específico episódio, o qual tem conotação eminentemente política e nada jurídica. O ponto que quero ressaltar é a relevância da atividade jornalística na função de informar o que seja verdadeiro e de interesse público. É claro que os jornalistas se obrigam à veracidade das informações e à preservação da privacidade e da intimidade quando não há interesse público. Na outra ponta, porém, é evidente que é ínsita da atividade jornalística a divulgação de fato relevante, sendo importante, neste ponto, mencionar-se a questão constitucional do sigilo da fonte e a não responsabilização do jornalista pela quebra da confidencialidade da informação, salvo se apurada a ocorrência de ato típico para sua obtenção.
Não se justifica e não se perdoa uma sociedade sem informação. Sem ela o próprio homem é incapaz de se desenvolver. A relevância da verdade sobrepõe-se a quase todos os paradigmas de uma nação e atrela-se à lisura e à transparência dos atos daqueles que integram o Poder Público. Não se ignora que, por vezes, há erros, descuidos e danos, dos quais não se arreda a correspondente responsabilização. No cotejo, porém, entre a verdade e a censura, fico, indubitavelmente, com a primeira, sem a qual a democracia não pode florescer. A oposição à verdade não é a mentira e nem a omissão. É a condenação de uma sociedade à sua completa ignorância e estagnação.
__________
Viviane Nóbrega Maldonado é juíza de Direito em São Paulo.
Foto: mw238.
[…] O jornalista e a liberdade de informação […]