28.04.10

Castração e prisão perpétua: chega de cumplicidade!

FAUSTO RODRIGUES DE LIMA
 
A imprensa está noticiando a prisão do “monstro de Luziânia”, cidadão que teria estuprado e matado seis adolescentes em janeiro deste ano. O acusado usufruía a liberdade depois de condenado a 10 anos de prisão pelo estupro de dois outros meninos. Beneficiado com a progressão de regime em 23/12/2009, ele só cumpriu 4 anos de prisão.
 
Não é justo, agora, criticar os promotores e juízes que atuaram na execução da pena. Eles apenas aplicaram a lei e a jurisprudência atuais. Adimar não foi o primeiro nem será o último a cometer crimes hediondos, cumprir pouco tempo de prisão e voltar a violentar pessoas. Anualmente, milhares de pessoas são vítimas desses egressos do sistema prisional.
 
Alguns sustentam que a solução está com os psiquiatras, seus laudos e terapias. Ledo engano. Médicos não são deuses nem fazem mágicas. Jamais afirmarão com segurança quem é ou não psicopata, quem vai ou não reincidir, quem está ou não “curado”. Aliás, a própria definição de psicopatia é vacilante e controversa. Afinal, os acusados de crimes perversos não são “monstros”; antes, são humanos como todos nós. É muito cômodo considerar o outro uma “aberração genética” para que possamos nos sentir pertencentes ao grupo dos “normais”. Ou a brutalidade não é da natureza humana?
 
Vejamos: qual é a pena real dos condenados por crime sexual? Simples: serem estuprados e torturados cada segundo que estiverem na prisão. A sociedade e o Estado, constituídos pelos “normais”, sabem disso e até se regozijam com essa realidade. Há um “prazer coletivo” sempre que se trancafia alguém nessas celas “sem lei”. Essa cumplicidade faz que o condenado, já problemático, potencialize sua capacidade de fazer mal aos outros. Um dia, ele voltará ao convívio social e o resultado é conhecido.
 
Por isso, há complacência legal e judicial com os presos em geral, buscando-se soltá-los o mais rápido possível, mesmo em detrimento do direito constitucional de todos nós à segurança. O caso de Adimar ilustra essa assertiva: condenado a pena de 15 anos pelo estupro de dois meninos, o Tribunal de Justiça do DF abaixou para 10 anos porque considerou “excessiva” a pena anterior. Isso possibilitou a liberdade precoce do acusado para fazer mais seis vítimas. Outro exemplo: a recente Lei nº 12.015 tem sido interpretada para favorecer os estupradores e pedófilos mais perigosos, conforme explicitado na crítica que fiz no artigo “Estupro e proteção insuficiente”, publicado neste mesmo espaço em 7/1/2010.
 
Qual a solução? Primeiramente, humanizar a prisão. Para isso, teremos que investir formidável fortuna para criar celas individuais, evitando que os presos sejam submetidos à “lei prisional”, bem como estabelecer o acompanhamento interdisciplinar dessas pessoas.
 
Depois, há que aumentar as penas e diminuir a possibilidade de progressão de regime nos crimes hediondos. Ora, além de punir e “ressocializar”, a finalidade da prisão é garantir a segurança pública, retirando indivíduos perigosos do convívio social. Isso se aplica não apenas aos presos violentos, mas também àqueles que causam mal a um número maior de pessoas, como os corruptos, que desviam milhões do orçamento da segurança pública ou da saúde, por exemplo.
 
Para os estupradores que saem da prisão, ou alternativamente a ela, é preciso considerar a castração química, já utilizada em alguns países. Essa medida “humanizaria” a pena, pois o preso ganharia a liberdade corporal em detrimento da liberdade sexual. Por fim, já passou da hora de adotarmos a prisão perpétua, pois há casos, e não são poucos, em que a pessoa não vai parar de cometer crimes. Quando atuei na promotoria de execução, havia um preso que era tarado por mulheres grávidas. Ele cumpria a pena, saía e estuprava novamente. Nós, representantes do Estado, assistíamos impotentes àquele ciclo bárbaro. A cada soltura não perguntávamos “se haveria”, mas “quem seria” a próxima vítima.
 
Nesse contexto, o sagrado direito à liberdade de uns tem significado o abuso sistemático de outros. A solução é a prisão perpétua. Ao contrário do que se imagina, ela não significa prisão “por toda a vida”, apenas exige critérios mais rigorosos para a liberdade. Ah, sem dúvida o Estado terá que suportar pesadas indenizações pelas mortes de Luziânia. A irresponsabilidade estatal não mais se sustenta. Aqueles meninos e outras vítimas da omissão pública não receberam a proteção firmada no pacto constitucional. Cabe a nós, contribuintes, arcar com as despesas e exigir de nossos representantes menos amadorismo.
 
___________
 
FAUSTO RODRIGUES DE LIMA é promotor de Justiça do Distrito Federal e coordenador e coautor do livro Violência doméstica – vulnerabilidade e desafios na intervenção criminal e multidisciplinar.
 
Artigo publicado no jornal Correio Braziliense, edição de 27/4/2010.
 
Os artigos publicados com assinatura não traduzem a opinião do blog.


5 Comentários

  1. Eu gostaria de tecer alguns comentários…

    Sobre a possibilidade de responsabilização do Estado, entendo ser esta inviável, já que o Estado foi obediente à lei, como o autor afirmou (“Não é justo, agora, criticar os promotores e juízes que atuaram na execução da pena. Eles apenas aplicaram a lei e a jurisprudência atuais.”)

    Sobre a prisão perpétua: o autor afirma que prisão perpétua “não significa prisão ‘por toda a vida’, apenas exige critérios mais rigorosos para a liberdade”. De fato, é isso o que esta expressão sugere, mas não basta “não prender para sempre” para que seja constitucional. A Constituição determina que “não haverá penas de caráter perpétuo” (art.5º, XLVII, b) e as penas não se limitam às privativas de liberdade. Em suma, só com outra Constituição.

    Sobre a castração química:
    Quanto a este assunto, admito que ainda não tenho opinião formada, mas algo me cheira estranho quando penso nisto, por alguns motivos (“políticos”/práticos e jurídicos):

    Já li/ouvi que a tal castração se dá com injeções periódicas que atuam não no físico do indivíduo (impossibilitando a ereção do pênis), mas no psicológico, por inibir a dopamina no cérebro, que é basicamente a substância responsável pelo bem-estar. Dessa forma, o indivíduo não sentiria vontade de ter relações sexuais, nem de ter qualquer outro estímulo “de vida”. Cinema, amor, livro, música, tudo perde a graça, da mesma forma que um viciado em cocaína se sente após cessar o uso (a cocaína, após longos períodos de vício, substitui a dopamina no cérebro; quando o uso é interrompido drasticamente, o viciado fica “sem vontade de viver”, pois perde o que lhe gera bem-estar). Não pensei muito à respeito, mas, com certeza, há quem dirá que fere a dignidade humana. Tenho minhas dúvidas. Posso inclusive estar errado quanto à dopamina etc. já que não lembro se o que li veio de fonte segura…

    O argumento “político”/pragmático é o seguinte. O remédio funciona enquanto durar o tratamento (injeções mensais). Ocorre que, após a interrupção das doses mensais, o pedófilo (ou qualquer outro criminoso sexual com distúrbios mentais) volta ao estado normal, COM MAIS APETITE SEXUAL QUE ANTES (essa informação eu ouvi de especialistas da área, no programa Conversas Cruzadas: http://www.youtube.com/watch?v=GMyJvj-pk50). Sendo pragmático, já que não há penas perpétuas, uma hora o tratamento vai acabar e o indivíduo estará livre de novo. E aí o resultado será PIOR que uma condenação à privativa de liberdade, já que ele sairá não igual, mas pior, e a reincidência será ainda mais provável. Se for assim, melhor continuarmos com as privativas de liberdade. Dos males, o menor…

  2. karen saliba disse:

    Tem toda razão o Dr. Fausto!
    Mas ainda é pouco: castração química não. É famoso um caso de um açougueiro alemão (se não me falha a memória)que estuprava crianças. Na prisão, pediu pela castração química e assim foi feito. Dado como recuperado por aqueles que o assistiam, foi libertado. Passado algum tempo, estuprou e matou uma menina de sete anos! No dia de seu julgamento, a mãe da criança, desvairada de dor, pulou do espaço reservado ao público e frente a frente com o fascínora, descarregou sete tiros nele! Portanto, sou da opinião que estrupador deve ser encarcerado. Castração, só a cirúrgica e, mesmo assim, não sei o que restaria da tara na mente de uma pessoa assim. Não sei se não atacaria e mataria de outra forma para satisfazer o seu desvio. Vai saber.
    Penso, como cidadã, que se sente eternamente ameaçada pela violência que grassa o País, seja pelos assaltantes, seja pelos assassinos, seja por estrupadores, q nova constituição deveria ser feita, pelo menos no que tange às questões criminais/penais, para que fosse instituída a prisão perpétua com trabalho forçado. Prisões autosuficientes que produzissem o que consomem – o trabalho seria dos presos, fosse qual fosse seu crime. Todos deveriam trabalhar para pagar sua estadia. E para os mais perigosos, aqueles considerados irrecuperáveis – estupradores, assassinos e traficantes, as prisões deveriam ser construídas nos mais longínquos rincões, donde fosse dificílimo fugir – a Amazônia,por exemplo. Grandes fazendas. Duvido que depois de trabalhar o dia inteiro, sob o sol e sob a chuva, tivessem tempo ou energia para se dedicar a outra coisa que senão dormir. Às suas famílias, restaria a visita virtual, ou uma outra solução à critério dos legisladores.
    Quanto aos ativistas de direitos humanos de plantão, que certamente se mobilizariam para preservar os direitos humanos desse tipo de gente, provavelmente nunca sofreram nenhuma das violências que essas pessoas são capazes de perpetrar contra outras.
    Estuprador, assassino, sequestrador e traficante provam, por suas ações, que não são humanos. São irrecuperáveis. Não têm pena nem dó de suas vítimas. A eles prisão perpétua e trabalho forçado.

  3. Ilanna Praseres disse:

    O autor sustenta pontos interessantes e expressa o entendimento de 99% da população brasileira, quiçá da população mundial.
    Feita essa consideração preliminar, cumpre esboçar o meu posicionamento sobre a matéria:
    Em primeiro lugar, acredito que a questão da criminalidade no Brasil é algo estrutural e não se resolveria com mais punição, pois leis severas já existem, o problema ocorre na execução.
    Outrossim, sou da opinião de que existem casos de recuperação difícil, não irrecuperáveis… Nessas hipóteses, o Estado deveria ser diligente e pensar em uma forma de punição que respeitasse a dignidade do preso e cumprisse as finalidades da pena, uma vez que são seres humanos que estão sendo privados da sua liberdade e não animais ou monstros, embora suas atitudes sejam monstruosas, não podemos perder de vista que o Direito Penal é do fato e não do autor, posto ser um retrocesso sustentarmos a idéia de inimigo.
    Dessarte, qualquer punição que fira os direitos humanos do preso (e embora não faça parte do presente discurso, mas ressalte-se que a vítima deve ser incluída), consiste em uma ofensaà nossa ordem constitucional e não deve ser admitida.
    Por fim, concordo com a colega Karen Saliba quando sustenta que as prisões devem ser auto-sustentáveis, afinal não tem lógica o Estado gastar mais com um preso, do que com a manutenção de um enfermo num Hospital. Quanto a visita virtual, trata-se de um posicionamento extremamente radical… Ora, não se pode falar em humanização da pena, sem pensar nos familiares do criminoso e queiram ou não, o dinheiro do tráfico ou seja lá do que for, sustenta muitas famílias brasileiras e apesar do filho, pai, irmão, etc. ter cometido um delito, o amor familiar não se apaga, falo isso porque já vi diversas mães de presos chorando, em que pese terem ciência do erro cometido pelo filho. Ademais, não se pode falar em moralização, em um Estado completamente desmoralizado… Ultrapassa os limites da razão penalizar a família com restrições indevidas (nesse momento os radicais respondem: e a família da vítima não foi penalizada? Cadê a justiça para os familiares das vítimas? A Justiça se faz com pena justa, a título de exemplo o depoimento da mãe de um dos meninos, asseverando desejar que ele continuasse vivo para cumprir a pena devida).
    Portanto, a problemática reside no fato de que sempre nos posicionamos como acusadores ou vítimas, será que pensaríamos da mesma forma se estivéssemos no banco dos réus? Devemos investir e apoiar políticas públicas sérias e pensar em um sistema penal que garanta os direitos da vítima e do réu!
    Aqui fica a minha reflexão…

  4. Tamara disse:

    Eu sou a favor de penas mais rigorosas nos nosso país. Afinal, todos conforme o art.5º da CF temos o direito à vida, mas e essas vitimas tiveram a escolha? Os bandidos preservaram os direitos delas? Não com certeza não, então para que preservar os direitos de um bandido? E pra falar bem a verdade claro que existe prisão perpétua no Brasil, pois agora vão coloca-lo em um manicomio e vão deixa-lo lá até ele morre. Isso não seria uma prisão?
    Eu sou a favor sim das penas de morte e prisão perpetua pelo fato, não pode chamar alguém de humano quando este mata tantas pessoas de forma brutal.

  5. CLAUDIO disse:

    PROGRESSÃO DE PENA NO BRASIL PARA CRIMES HEDIONDOS É O FIM DA PICADA!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!ISTO É UMA TREMENDA IMPUNIDADE!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!SÓ NESTE PAIS MESMO PARA SER ACEITO ISTO!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!.