10.03.14
Internet: entre lembrança e esquecimento
O aperfeiçoamento dos mecanismos de busca, somada à onipresença da Internet proporcionou uma verdadeira revolução na forma como nos comportamos. Ao juntar a conveniência do smartphone com a indexação precisa dos buscadores, a informação tornou-se abundante e de fácil acesso. Fatos do passado são, a todo momento, resgatados. Isto nos leva ao tema de nossa preocupação: deveríamos incluir o esquecimento em tal equação?
A concepção de um “direito ao esquecimento” é antiga, mas ganha nova roupagem em razão do profundo impacto social da Internet onipresente. Não se trata de reescrever a história, mas de atenuar eventuais usos abusivos de fatos do passado – pelos quais a pessoa já teria sido punida de forma razoável. Embora sua arquitetura original tenha programado a Internet para tudo lembrar, isso não impede sua modificação para melhor proteger determinados direitos. Há que se permitir que os indivíduos possuam um mínimo de controle sobre seus dados pessoais – o que inclui a possibilidade de decidir acerca da circulabilidade ou não de determinadas informações individuais sensíveis.
O que podemos ou não realizar no mundo físico depende diretamente da forma como ele se apresenta a todos nós. O mesmo ocorre no que toca ao espaço virtual, que condiciona nossa conduta pelo código de programação – daí a afirmação do americano Larry Lessig pela qual “code is law” ou “o código é a norma”. Determinadas características da Internet podem e devem ser modificadas, a fim de que seu uso seja harmonizado para se atingir uma concordância prática entre os direitos fundamentais envolvidos.
Efetivar um “direito ao esquecimento” na Internet para proteger a honra individual é possível, a depender do código que lhe dá forma. Todavia, é imprescindível que a ânsia pela tutela da imagem e da privacidade não transporte todo o peso para o lado oposto da balança – levando a uma situação indesejável de sufocamento da liberdade de expressão. Afinal, embora existam situações claras de abuso sobre direito alheio, a grande maioria dos casos polêmicos se enquadram em zonas de penumbra nas quais há muitos argumentos a serem ponderados, que vão da necessidade de proteção maior a determinadas expressões (como as manifestações políticas) até a relativização da esfera de privacidade de autoridades governamentais. Disso emerge uma certeza: o desafio do direito ao esquecimento na Internet está na construção de critérios que nos levem à escolha do que deve ou não ser lembrado a todo instante.
_________
Cláudio Colnago é advogado e professor de Direito Constitucional da Faculdade de Direito de Vitória (FDV). É doutorando em Direitos e Garantias Fundamentais pela FDV. Presidente da Comissão de Estudos Constitucionais da OAB/ES.
Publicado originariamente no jornal A Gazeta, edição 9/3/2014, sob o título “Direito à privacidade”.
Foto: Pixabay.